A publicidade processual tem fundamento constitucional, no art. 93, IX: “Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”.
Ao conferir primazia à publicidade e prever o sigilo como exceção, a Constituição brasileira optou por priorizar a informação, a transparência e o interesse público no acesso aos atos praticados por agentes públicos.
Na sua principal classificação, a publicidade pode ser:
(a) interna, ou endoprocessual, tendo como destinatárias as partes do processo e seus representantes;
(b) e externa, ou extraprocessual, assegurada para qualquer pessoa fora do processo, interessada ou não.
A publicidade processual gera uma dupla consequência: a proibição de atos processuais e (especialmente os) julgamentos secretos; e a exigência de que todas as decisões judiciais sejam acessíveis ao público externo ao processo.
A publicidade externa (ao lado da fundamentação) possibilita o controle dos atos judiciais, ao permitir que todas as pessoas que não participaram do processo exerçam democraticamente a verificação dos atos praticados.
Em suma, a publicidade consiste na prática pública ou na divulgação oficial dos atos processuais, para permitir o início de seus efeitos e o controle dos atos por meio do conhecimento público. É, ao mesmo tempo, transparência e informação, usadas para o controle interno e externo dos atos processuais.
Abrange a transparência de todos os atos praticados pela Administração Pública e a permissão de acesso a todos eles, independentemente da demonstração de interesse.
A publicidade dos atos processuais é a regra no Brasil. Excepcionalmente a Constituição restringe a publicidade externa ou extraprocessual, ou seja, admite o sigilo extraprocessual, por uma razão: para preservar o direito à intimidade do interessado, quando isto não prejudicar o interesse público à informação.
A entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD - Lei nº 13.709/2018) trouxe a necessidade de adequação não apenas por organizações privadas, mas também pelas pessoas jurídicas de direito público. Entre elas, os tribunais brasileiros devem se adaptar à observância da LGPD nos processos judiciais e em outras atividades (tais como a consulta processual, a publicação de decisões na movimentação processual e em Diário Eletrônico, e a pesquisa de jurisprudência).
Além das controvérsias e dúvidas existentes sobre as relações entre o princípio da publicidade processual e as normas da LGPD (sobre o assunto, veja o texto que escrevi aqui), também devem ser delimitadas as regras sobre a coleta de provas na internet.
É livre a coleta de dados na internet para uso no processo judicial?
Por exemplo, a pesquisa de endereços do réu ou executado em bancos de dados de órgãos públicos, em redes sociais e em outros sites pode ser realizada sem restrições?
Uma pessoa pode adicionar outra na rede social apenas para coletar dados pessoais (que ela compartilha com parentes e pessoas próximas) a serem usados no processo judicial?
O exercício regular do direito em processo judicial, administrativo ou arbitral, base legal prevista na LGPD para o tratamento de dados pessoais, sensíveis ou não (arts. 7º, VI, e 11, II, ‘d’), é suficiente para justificar toda e qualquer operação de tratamento de dados pessoais com a finalidade de sua utilização como prova nos processos judiciais?
Quais os limites para a utilização de base legal diversa do consentimento, com a observância dos princípios de tratamento e dos direitos do titular (art. 7º, § 4º, da LGPD), para os dados pessoais coletados dos atos processuais? Considerando que a finalidade do tratamento é o exercício de um direito ou da defesa do titular, o tratamento para outros fins não deveria levar em conta a possibilidade de um consentimento específico como base legal?
Essas são algumas das questões que surgirão na prática e deverão ser enfrentadas, para compatibilizar o princípio da publicidade com a proteção de dados pessoais nos processos judiciais.
Artigo também publicado no Jusbrasil (clique aqui) e no Jus Navigandi (clique aqui).
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